A disciplina e o senso moral, aprendidos desde a infância, foram anteparos a uma selvageria que só encontra espaço quando a cultura prevalecente é a do individualismo.
Três fundamentos morais, explicitados em artigo da Monja Coen, após 12 anos morando no Japão, em monastério Soto zen-budista, revelam as razões de a pequena ilha ter atingido o atual estágio de desenvolvimento. 'Kokoro', a relevância do coletivo sobre o individual; 'gaman', fazer da dor alavanca para a reconstrução e da derrota estímulo para vitória; e 'sumimasen', humildade altiva e que marca posição – diferente do escândalo ocidental diante de algo errado, os japoneses preferem um "sumimasen, será que nos enganamos?".
Acrescento os princípios 'gimu', dever moral, senso de responsabilidade; e "orei", que expressa a gratidão. Lembro-me do provérbio árabe: "Por que me odeias tanto? Será que te fiz algum favor?".
Eis o mistério pelo qual o flagelo triplo (terremoto, tsunami e crise nuclear) não levou japoneses a saquear armazéns ou sequer furar filas de banhos ou refeições. A disciplina e o senso moral, aprendidos desde a infância, foram anteparos a uma selvageria que só encontra espaço quando a cultura prevalecente é a do individualismo.
Há 350 voluntários lutando nas usinas de Fukushima, já contaminados pela radiação e que em meses estarão mortos, empenhados em honrar suas famílias gerações afora, assim como covardes transmitem a desonra secularmente.
E o líder dos 50 samurais, humilhantemente repreendido pelo suserano na frente de toda a aldeia? Fez imediatamente o harakiri. Seus guerreiros não reagiram, porque a desvantagem numérica os manietava. Passaram a frequentar prostíbulos, a simular bebedeiras, vistos como desmoralizados, indignos do respeito dos inimigos, desprezíveis… inofensivos.
Três anos após a morte do líder, inverno inclemente, dirigiram-se os 50 ao castelo. Mataram a guarda palaciana, relembraram ao suserano por que devia morrer e o executaram para, logo a seguir, com a dignidade dos samurais, praticarem o harakiri.
A bravura de hoje é tão sublime que, daqui a séculos, talvez pareça mistura de lenda com realidade.
Povo notável.
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Por Arthur Virgílio Neto
Fonte: http://blogs.d24am.com/artigos/2011/04/11/kokoro-gaman/?utm_medium=twitter&utm_source=twitterfeed
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